quarta-feira, 28 de abril de 2010

Manta azul

Ela via o mundo sob aquela velha manta azul, herança dos pais que partiram há anos. A única proteção real que ainda sentia possuir. Mantinha-se acordada, com os olhos fechados. Deles, duas lágrimas despencaram e aninharam-se entre o rosto pálido e o travesseiro recém tirado do sol. Só o que ela desejava era permanecer ali, estática e segura embaixo da manta azul. Continuava à espera de algo que não conhecia, mas, que colocaria fim aquela solidão que a invadiu. Dos olhos fechados deslizavam suas angústias e temores. E de repente, a umidade que se formava transformou-se, estranhamente, em algo agradável. Sua expressão inesperadamente desanuviou-se e deu lugar a um singelo sorriso que nasceu nos lábios. Ela estava amparada pela manta azul. Virou para o lado e dessa vez os olhos fechados significavam que ela encontrara o mundo dos sonhos.

quinta-feira, 22 de abril de 2010

Essa noite, simplesmente

O aroma de fruta no corredor, na cama, no banheiro. Amadeirado, encorpado, austero. O olhar de mistério, o meio sorriso, a incerteza. Pela casa, junto ao corpo, na mente, simplesmente, simples-mente.
Uma saudade que ainda não chegou me carrega no colo.
Toca a mesma música que você cantarolou há poucos minutos.

Mas, quem é você?
Não se preocupe com a dúvida. Também não sei quem sou.

Alimento recordações do agora. Você está logo ali.

Ouço o barulho do chuveiro.
Escuto teus passos.
Abriu a porta.
Voltou para a cama.
Deitou ao meu lado.
Me abraçou.
Me beijo a testa.
E não disse! A gente não disse.

Muitas vezes não há o que ser dito. E o não dito esconde segredos, e mistérios. Aqueles mesmos, que saltam dos teus olhos e que não dizem nada, mas dizem tudo.

Não! Sei que não preciso de você e tão pouco você precisa de mim, mas, será que você pode ficar aqui hoje, essa noite?

segunda-feira, 12 de abril de 2010

Ins-piração

Inspiro você, expira-me eu. Desabam todos na tranqüilidade da noite. Tempestades de palavras numa janela de sossego. O sol lá fora brilha cego e cala. Novamente escondemos nossas vozes. Eu vejo o mundo preto e branco com minha visão multicolorida. E aqui permanecemos, na ventania.

sexta-feira, 2 de abril de 2010

Gargalhada

Era uma gargalhada alta e aguda.
Quanto mais a balançavam, mas ela ria. E os cachos dourados dela voavam com o vento. As pequenas mãos seguravam com força no balanço.
E não importava o calor, o sol forte, as outras crianças ao redor. Não importava a bola que voava de um lado para o outro, nem a voz adulta dizendo para irem mais devagar.
Com a cabeça pra traz ela simplesmente pedia:
- Mais forte, mais forte!
E era atendida.
Não havia preocupações, angústias, medos. Não havia pensamentos de qualquer espécie. Apenas aqueles olhinhos arregalados e um sorriso nos lábios acompanhado da gargalhada. Ahh a gargalhada! Como era boa de ouvir.
Para qualquer outra pessoa, uma cena normal de uma criança se divertindo. Pra mim, que observava fascinada da janela, um momento de felicidade plena, pura e simples.
Eu me vi nela!